Quem quer ser bilionário?


O que fazer para sobreviver?

Este filme é daqueles encontros, necessariamente poucos, que não nos deixam indiferentes. É impossível!

Por diversas razões. Porque nos mostra como se sobrevive em Bombaim, desde as crianças até aos adultos (que as usam para sobreviver): os adultos cegam-nas para poderem render mais nas esmolas.

A ideia de perfeição ou imperfeição, a teoria de que somos essencialmente bons, ou essencialmente maus, o próprio significado de pensar sobre o assunto, de teorizar sequer, cai por terra, como se perdessemos a inocência.

Se aqui [em Portugal] discutimos se colocamos o aeroporto a norte ou a sul do Tejo, lá discute-se cada cêntimo, cada cm quadrado. E não é com o objectivo de saber mais, de ter melhor emprego, um outro automeovel ou uma férias diferentes, é apenas para sobreviver um dia mais.

Porque nos mostra o equilibrio precário em que vivemos, sob todos os aspectos: as relações de amizade que sobrevivem, mas que vão sendo quebradas e reactivadas num complexidade absorvente. As relações de poder precário, hoje rei amanhã morto. A precariedade do lugar-tempo, nada é eterno, tudo se modifica segundo a segundo, numa escalada de medos amordaçado noutros medos, até tudo se transformar em ausência de inocência, ninguém confia em ninguém.

Enchemo-nos de teorias sobre como deveria ser, falamos da injustiça e do estado das coisas, da política, de não nos ser possível fazer uma férias. Defronte àqueles pequenos que nunca saberão o que é a infância, todas essas palestras eloquentes afundam num lago de merda. Aliás, de que lhes serve teorizar, nem nunca o vimos fazer, em todo o filme, alguém teorizar.

Por ali sobrevive-se no meio dos restos, é só isso que conta, chegar ao minuto seguinte, à hora seguinte, ao dia seguinte.

Se não te mexes és morto.

Se não ages és trucidado.

Se não foges és amordaçado.

Se não matas és morto.

Uma verdadeira guerra.

Para nada serve ter pena ou fazer juizos de valor: isso são luxos do ocidente. Aquilo que vimos acontece, neste momento!

Este é o nosso ponto de vista. Qual será o deles sobre a sua própria vida? Gostava de ouvir a opinião de um indiano sobre o modo como os descreveram.

Neste filme só não percebi porque, de repente, sem saber de onde vinham,  e porquê, como que nascidos do outro lado da linha, homens armados de paus e facas, arremessaram-se contra o bairro de lata, matando à sua passagem, indiscriminadamente homens, mulheres e crianças.

Também destuou a história de amor. Daquelas à moda antiga: ele que nunca a esquece e nunca perde a determinação de a encontrar. Esta parte não esteve à altura do resto do filme, nem actores nem realizadores.

Em suma gostei do filme pela forma como nos mostrou um quotidiano completamente diferente daquele a que estamos habituados, completamente diferente dos valores que seguimos.

Contudo, Arundhati Roy, afirma, na edição de Abril do Courrier Internacional que “Não gostei do filme”, e argumenta “O guião é simplista e os diálogos mais do que medíocres”, até ai podemos nós chegar, mas depois, fala da sociedade indiana, “Este filme tem como único efeito tornar asséptica a realidade.”

Eu que já estava impressionado com a vida daquelas crianças, fico sem saber o que significa asséptica neste contexto, quer dizer que será ainda pior do que aquilo que observámos, e de que modo o é? Prossegue o seu texto dando exemplos, referindo que a escolha de uma modelo indiana e um jovem britânico destoa do contexto dos bairros de lata onde sobrevivem pessoas com marcas físicas do quotidiano desses bairros sem condições. Ok! A realidade é muito pior do que aquilo, já de si aterrador, que vimos, e que está a acontecer agora, enquanto lemos estas linhas.

A Year In India

O Livro: quem quer ser bilionário

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